Disciplina - Física

Física

06/06/2013

Onda de energia limpa

Por Adriana Bittencourt


Não, não é truque de Photoshop. Os tons de azul e verde da água do mar, o céu dourado no pôr do sol, o colorido dos corais de peixinhos são pura verdade em Fernando de Noronha, em Pernambuco.

Quando Américo Ves-púcio chegou por lá, em 1503, chamou o local de “verdadeira maravilha da natureza”. Os turistas de hoje parecem concordar com sua opinião, porque o número de visitas não para de crescer desde a década de 1990.

Na categoria turismo de natureza, certamente este é o melhor destino de praia do país. Em Noronha, três delas ganharam cinco estrelas do “Guia Quatro Rodas Brasil 2013”: a da baía do Sancho, a da baía dos Porcos e a do Leão. São as melhores, mas seria um pecado ignorar as outras dez praias de quatro estrelas do arquipélago, como a do Boldró, a Cacimba do Padre e a da Conceição.

E não é beleza apenas para fotografar, mas para curtir. Noronha tem as melhores condições para prática de mergulho autônomo (visibilidade horizontal que chega a 50 metros) e, naturalmente, de mergulho livre (com snorkel). Nos meses de janeiro e fevereiro, chegam os surfistas que vão encarar as ondas de até cinco metros. Mas, para os turistas que podem conhecer o local, não basta uma bela paisagem, golfinhos no mar e atobás no céu. É preciso um certo conforto – como TV, ar-condicionado e banho quente no quarto da pousada. Haja energia.

Para atender a essa demanda, a ilha apela para a Usina Termelétrica de Tubarão. Ela queima uma média de 310 mil litros de diesel por mês, para gerar 3,2 MW, fazendo muito barulho e poluição. Além disso, o combustível precisa ser transportado de navio para a ilha – já pensou se um acidente o derrama no mar?

Ainda este ano, um projeto feito em parceria com os governos federal e estadual promete viabilizar duas usinas solares e 13 geradores eólicos. Ano que vem, é a vez de uma usina de pirólise, que queima o lixo não reciclável de modo controlado, gerando menos poluição do que uma incineração normal – além de energia. De quebra, ela resolveria o problema das três toneladas de resíduos geradas por dia no arquipélago, que são enviadas ao continente ao custo de R$ 15 mil mensais.

Pura cinética
A maior novidade, no entanto, será uma usina marítima, prevista para funcionar em 2014. A tecnologia usa barcas fixadas no fundo do mar, com pás flexíveis que transformam a energia do vaivém das ondas em eletricidade. O mecanismo já foi testado no mar de Peniche, área portuguesa de preservação ambiental com características semelhantes às de Noronha.

“Ela não agride o ambiente. Como o mar é aberto, a placa funciona até como uma proteção para a vida marinha”, diz Fernando Machado, da Secretaria de Ciência e Tecnologia do governo de Pernambuco e responsável pelo projeto.

Mas ONGs e órgãos de preservação ambiental ainda se mostram desconfiados. “Ainda não podemos afirmar nada”, diz Ricardo Araújo, chefe do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha. “A usina pode ter influência para corais e peixes do local”. O governo de Pernambuco afirma que todos os projetos se enquadram nas exigências da legislação ambiental vigente, tanto federal quanto estadual.

“Mas só teremos uma resposta conclusiva sobre o impacto ambiental de todos os sistemas quando os equipamentos estiverem instalados de fato”, pondera Ricardo Baitelo, coordenador da Campanha de Energias Renováveis do Greenpeace Brasil.
O mar como nova fronteira energética
O mar tem sido encarado pelos pesquisadores do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFJR), como uma fronteira estratégica na qual o Brasil pode ser o líder tecnológico. Somente no projeto de uma usina de ondas no Ceará, foram investidos R$ 15 milhões em quatro anos.

O potencial é grande. O litoral brasileiro, de cerca de 8.000 Km de extensão, é capaz de receber usinas de ondas que produziriam 87 gigawatts. Na prática, de acordo com especialistas do Coppe, que desenvolve a tecnologia, é possível converter cerca de 20% disso em energia elétrica, o que equivaleria a 17% da capacidade total instalada no país.

O Ceará é pioneiro na geração de energia cinética, e não foi escolhido aleatoriamente. Sua grande vantagem estratégica é a constância dos ventos alísios, resultado da rotação da Terra. O movimento do ar gera ondas regulares no mar brasileiro. Elas não são grandes, mas estão sempre batendo.

“Há alguns anos, o Brasil, por suas características, não era incluído em debates ou fóruns internacionais. Hoje, entendemos que não basta ter ondas grandes. Elas atuam em somente 20% do ano. Já as nossas batem de forma constante em mais do que 70% do ano”, diz Segen Estefen, professor de Engenharia Oceânica do Coppe. “Nas próximas décadas, as atividades vão acontecer cada vez mais no mar, que cobre 71% das superfície do planeta”, completa.

Mas ainda há um longo caminho a ser percorrido para que as usinas de onda passem a fazer parte da paisagem brasileira. Os especialistas evitam compará-las às hidrelétricas, que, em geral, têm custo de produção quatro vezes menor.

Carpe diem sem frescuras
O arquipélago de Fernando de Noronha pode ser visitado o ano todo, já que a temperatura é estável, entre 25° e 30° Celsius. Mas, para a maioria dos turistas, os melhores meses são setembro e outubro, quando o mar está calminho e chove bem pouco por lá – não se engane, pois a procura pelo destino sempre é grande, reserve tudo com antecedência.

Mas, para desfrutar das praias mais belas do país, é preciso esquecer o conceito guarda-sol e cadeira de praia ao som do ritmo da moda. Mesmo que você tenha bancado as hospedagens mais luxuosas, como nas pousadas Maravilha ou Zé Maria, o turista terá que aderir ao clima despojado de Noronha.

Em quase todas as praias, não há infraestrutura para o banhista. Nada de barracas, banheiros, chuveiros. Para mergulhar em algumas piscinas naturais, os monitores ambientais exigem que os visitantes não passem filtro solar no corpo, pois os componentes químicos do produto prejudicam a vida marinha.

Para chegar até a areia, provavelmente você subirá em um bugue ou fará uma caminhada por uma trilha. Leve água na mochila e comprove que vale a pena abrir mão do conforto para esse contato com a natureza.

Esta notícia foi publicada em 05/06/2013 no site http://www.otempo.com.br. Todas as informações contidas são responsabilidade do autor.
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